por Luiz Carlos Azenha
Ver o desfile das escolas de samba na Globo é sempre um exercício divertido. Aparentemente os que dirigem o espetáculo decidiram que a transmissão andava muito morna e decidiram acelerar o ritmo. O ritmo agora é o do twitter, de tal forma que você engole sem sentir o gosto.
É um bombardeio visual que considera que os telespectadores — aqueles poucos que resistem — não têm tempo nem disposição para relaxar diante da TV, em plena madrugada de Carnaval.
Como falam os narradores, atravessando o samba!
A Globo transformou o Carnaval do Rio num bigmac visual, mas decidiu que a gente leva tempo demais para digerir e desocupar a mesa. E, por não acreditar que temos paciência, assumiu como missão nos enfiar lugares-comuns goela abaixo.
E tome truques visuais para fazer “passar o tempo”. Quando você começa a tomar gosto por algum samba-enredo, eles se encarregam de contar uma “história de superação”.
Com muita propriedade, a Globo entregou a narração a profissionais do esporte. É o casamento do samba-pagodeiro com o futebol e as celebridades.
O problema é que os narradores parecem acreditar que estamos realmente interessados em suas “impressões pessoais”.
Ou nas “histórias de superação”, a que tudo é resumido.
Joãosinho Trinta? Superação.
Romero Britto? Superação.
Jorge Amado? Superação?
Foi engraçado ver o narrador da Globo dançando em torno do fato definidor da vida e da carreira de Jorge Amado: ele era comunista (não há implícito, nisso, nenhum elogio à obra de Amado, que muitos acham repetitiva e rasa).
Amado, homenageado pela Imperatriz Leopoldinense, foi identificado duas vezes, de forma envergonhada, como deputado do Partido Comunista, mas o grande mérito da obra dele, na visão da Globo, parece ter sido o de inspirar montagens de novelas… da Globo.
Portinari, homenageado pela Mocidade, não foi identificado como comunista, mas empacotado junto com Romero Britto no escaninho dos “grandes artistas brasileiros”.
Curiosamente, os narradores da Globo destacaram positivamente o comercialismo da obra de Romero Britto, homenageado pela Renascer de Jacarepaguá. Para formar o quadro, Britto apareceu depois do desfile falando português com sotaque, uma espécie de versão brasileira do Gonzalo Sánchez de Lozada, o presidente boliviano que mal falava espanhol.
[Tendo morado quase 20 anos nos Estados Unidos, sei que nenhuma pessoa perde a capacidade de falar o português sem sotaque, a não ser que faça esforço para 'esquecer' o idioma]
Portanto, anos-luz separam Portinari de Romero Britto.
O primeiro ao menos fez um esforço intelectual para integrar a essência do Brasil à sua arte, que engajou numa tarefa transformadora (para arrepio dos que lamentam o realismo socialista); o segundo integrou as cores brasileiras à sua arte para vender em tempos de globalização. Uma espécie de Andy Warhol pernambucano, atrasado.
Não apareceu ninguém na Globo para notar a ironia.
No Carnaval-esporte da Globo já não cabem ironias.
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Marcos Imperial