quarta-feira, 3 de abril de 2013

Respeitar as diferenças é preciso

Chico Vigilante
CHICO VIGILANTE.

Episódios inaceitáveis de homofobismo, verdadeiros atentados aos direitos da pessoa humana, ocorrem constantemente em vários países do mundo ocidental e oriental, inclusive em alguns com legislações consideradas avançadas.

Certas questões na história da humanidade são de tamanha complexidade que mesmo o passar dos séculos não é suficiente para criar culturalmente um consenso a respeito. A homosexualidade é uma delas.

No livro Born to be Gay, o autor William Naphy mostra que nem sempre os homossexuais foram vistos de forma discriminatória. Muitas culturas antigas aceitavam e pregavam as relações entre pessoas do mesmo sexo, fosse como ritual de entrada na adolescência ou com funções associadas ao culto. 

Muitos autores são unânimes em afirmar que somente com a ascensão do judeo-cristianismo iniciou-se a marginalização da homossexualidade. Ou seja, se fizermos um corte transversal no tempo e espaço de nossa civilização veremos que um comportamento visto como absolutamente natural passou a ser considerado “pecado”  e qualificado de crime passível de morte, em muitas nações.

A literatura a respeito não é coisa apenas da modernidade. O romano Suetônio escreveu em seu As Vidas dos Doze Césares, livro do século 2, sobre os hábitos dos governantes do fim da República e do começo do Império Romano. Dos 12, só um deles, Cláudio, nunca teve relações homossexuais. O mais famoso, Júlio César (100-44 a.C.), teve um relacionamento com o rei Nicomedes. 

O conquistador Alexandre, o Grande (356-323 a.C.), também foi conquistado. Seu amante era Hefastião, seu braço direito e ocupante de um importante posto no Exército. Quando ele morreu de febre, na volta de uma campanha na Índia, Alexandre caiu em desespero: ficou sem comer e beber por vários dias. Mandou proporcionar a seu amado um funeral majestoso: os preparativos foram tantos que a cerimônia só pôde ser realizada seis meses depois da morte. Alexandre fez questão de dirigir a carruagem fúnebre, decretando luto oficial no reino.

Sobre o homossexualismo feminino existem muitos poucos registros até o século XVIII mas o historiador romano Plutarco dizia, já no século I, que na cidade grega de Esparta todas as melhores mulheres amavam garotas.

O que tinham em comum pessoas nascidas em épocas tão distintas como o filósofo Sócrates (469 a 399 a.C), o imperador Nero (37-68 d.C.), o artista e inventor Leonardo da Vinci (1452-1519), a rainha da França Maria Antonieta (1755-1793), o dramaturgo Oscar Wilde (1854-1900), os cantores Cazuza (1958-1990) e Cássia Eller (1962-2001), dentre tantas outras personalidades do mundo das artes, da ciência, da filosofia? Costumavam manter relações sexuais com pessoas do mesmo sexo. Wilde, por exemplo, condenado por sodomia a dois anos de trabalhos forçados na prisão, ai definhou, morrendo  logo após sair.

Estariam todos eles errados? Quem somos nós para proferir julgamentos? Apenas agiam de acordo com seu coração e com suas crenças de que cada um tem o direito de escolher o que é melhor para si. Mas na vida em sociedade é necessário obedecer a leis e convenções. Portanto, precisamos analisar, discutir e nos posicionar.

O mundo está repleto de bons e maus exemplos. Um relatório da ILGA, divulgado em Genebra em 2012, revelou que  78 países do mundo consideram o homossexualismo como orientação sexual ilegal, e que apenas 11 permitem o casamento entre pessoas do mesmo sexo ( Portugal, Espanha, Holanda, Bélgica, Suécia, Noruega, Dinamarca, Islândia, Canadá, Argentina e África do Sul. 

Europa é a região onde os direitos dos homossexuais são mais atendidos  e a pior situação se dá no Irã, Arábia Saudita, Iêmen, Mauritânia Sudão onde a homossexualidade é punida com a morte, o que ocorre também em algumas regiões do norte da Nigéria e do sul da Somália. Na Ásia metade dos países criminaliza a homossexualidade e em Bangladesh, por exemplo, é punida com prisão perpétua.

No nosso continente, o maior problema é a violência contra homossexuais. A  maioria dos países não tem legislação proibindo a homofobia, mas mesmo em países como Argentina, Colômbia e Uruguai que já aprovaram legislações contra a homofobia, muitos casos de desrespeito e crimes contra estas pessoas continuam ocorrendo à luz do dia. Na Rússia, os índices são alarmantes. Cerca de 45% dos russos dizem ter emoções negativas ao lidar com homossexuais.

A exceção africana no reconhecimento dos direitos da comunidade gay é da África do Sul, onde desde 1996 existe o direito de união, em um continente onde a homossexualidade é proibida em cerca de 30 países e punida com a prisão na maioria deles.  

Nos EUA, a discussão chegou à Suprema Corte este mês e pegou alguns ministros despreparados. Eles questionaram se não teria sido melhor deixar os estados continuarem a testar soluções para a questão separadamente. Nove dos estados americanos já aceitam legalmente a união gay e somente na Califórnia cerca de  40 mil crianças vivem com pais homossexuais. 

O presidente Barack Obama, defensor da causa, reiterou seu apoio no último dia 23 por meio de uma conta no Twitter administrada em seu nome pelo 'Organizing for Action', um grupo de pressão fundado após sua reeleição. "Cada americano deveria poder se casar com a pessoa que ama", dizia a página no Twitter, com a hashtag "#LoveIsLove".

No Brasil, país com expressiva população homossexual, cerca de 24 milhões de pessoas, responsáveis pelo consumo de 150 bilhões de reais ano, a legalização do casamento gay em tramitação no congresso ainda não é uma realidade mas algumas conquistas importantes aconteceram nos últimos anos, dentre elas, a permissão de que um par homossexual pleiteie a adoção conjunta de uma criança, por jurisprudência firmada em casos tramitados junto ao STF.

Acredito que a sexualidade humana seja produto de condições históricas específicas e que o sentido de gênero é principalmente construído e não determinado biologicamente. A expressão da sexualidade é influenciada pela tradição, cultura, economia, princípios éticos, ou seja, tudo o que se pode chamar de estrutura político-social de uma sociedade. 

O surgimento de grupos organizados de homossexuais no Brasil e no mundo foi significativo para a busca por respeito e direitos iguais. O comportamento da sociedade de uma forma geral, no entanto, ainda revela que existe muito caminho a percorrer para eliminar a homossexualidade da lista das palavras proibidas. É necessário tolerância com as diferenças. Devemos todos meditar a respeito. Dep. Chico Vigilante. Líder do Bloco PT/PRB postado por Marcos Imperial.

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