
José Rodrigo Rodriguez, Blog do José
Rodrigo Rodriguez
"Mas afinal para que serve a poesia? Para quem não sabe
ainda, sou autor de dois livros de poesia, “Meus Seios” e “Peixe Insolúvel”,
ambos pela Nankin Editorial.
Continuo publicando e acreditando na necessidade de fazer
versos, mesmo sabendo que este campo tem perdido muito de seu sentido, de seu
interesse, de seu significado social.
Antigamente, a arte de fazer versos se ocupava, ela sozinha, dos
mais diversos gêneros literários. Havia poemas cômicos, poemas narrativos,
poemas filosóficos, poemas políticos, poemas de guerra, poemas de amor e mais
tantos outros subgêneros da poesia.
Aos poucos, o romance e outras formas de arte mais recentes,
como o cinema e a TV, passaram a disputar com a poesia seus assuntos e a
atenção do público.
Mas o que mudou na verdade foi a experiência que temos do mundo.
De preferência com 20 minutos.
Quem tem paciência hoje para ouvir e investigar como alguém se
sente realmente? Prestar atenção em suas palavras para tentar descobrir o que
está além delas?
Para tentar descobrir o que é verdade e o que fica escondido de
nós mesmos? Tentar identificar no texto que estamos dizendo a essência de nossa
alma?
Porque as palavras não são apenas um meio para transmitir
informações. Elas são algo em si. O “como” se diz é tão importante quanto “o
que” se diz. Há frases simples e claras que dizem exatamente o contrário de
seu valor de face.
Quantas vezes “eu te odeio” não quis dizer “eu te amo”? Quantas
vezes “eu não preciso de ajuda” quis dizer, “eu estou desesperado”?
O elogio e a militância radical pela comunicação fácil, pela
capacidade de ser sempre claro e objetivo, está fazendo com que percamos a
capacidade de prestar atenção de verdade nos demais seres humanos.
Está fazendo com que percamos a capacidade de nos relacionar de
verdade com outras pessoas.
A clareza é positiva e desejável em memorandos de empresa, em
aulas ministradas nas escolas e nas universidade, em “papers” acadêmicos. Em
todos esses casos, é dever de quem fala estar no controle das palavras para
tentar eliminar ambiguidades e comunicar com precisão o que se deseja.
Mas não é possível fazer um memorando sobre o estado da nossa
alma.
Na vida cotidiana, nas relações pessoais, nas relações afetivas,
em que as emoções nos assaltam a cada minuto, em que uma declaração de amor
pode soar como uma ameaça e receber de volta uma agressão, não temos o direito
de cobrar de quem fala o domínio sobre o que diz.
Agredir a quem nos ama não faz sentido algum, certo?
Pensemos um pouco. Uma declaração de amor, de fato, não é uma
ameaça à nossa vida como ela é hoje? Ela não torna concreta a possibilidade de
construir uma vida nova e destruir o equilíbrio, sempre tão instável, de nossa
existência atual? Mesmo que seja infeliz, ela nos traz alguma segurança.
Fácil entender, portanto, como o amor pode gerar o mais profundo
medo.
É pedir demais em casos como esse que as pessoas permaneçam
senhoras de si e de suas palavras. É pedir demais que elas permaneçam capazes
de dizer o que realmente sentem, pois é justamente isso que está em jogo. É
exatamente isso que está em questão.
Elas não sabem o que sentem e muitas vezes não saberão jamais.
Algumas terminam ficando quietas e procurando não pensar nunca mais no assunto.
“Não fale do que não sabe”, dizia meu pai. Nada mais antipoético
do que isso.
Mas há pessoas que se arriscam e procuram se aproximar desses
estados de indeterminação e desespero.
Estados em que o amor, a fé em Deus, o entusiasmo por uma ideia,
por uma forma de vida, por uma visão do humano ou da natureza nos incomoda, nos
confunde e nos ameaça com a mudez.
Há pessoas que não sabem, sentem medo, mas dizem mesmo
assim.
Mesmo quando as palavras se tornam impotentes e praticamente se
despedaçam na nossa frente. E é preciso juntar seus cacos para construir uma
gramática a partir do zero. E é preciso reinventar a sintaxe para tentar
expressar o que ninguém conseguiria dizer de forma clara e objetiva.
Por isso alguns poemas soam tão difíceis: porque algumas coisas
são mesmo difíceis, praticamente impossíveis de se dizer.
Tentar manter o controle quando sabemos que iremos falhar,
quando sabemos que corremos o risco de acabar insultando a pessoa que mais nos
amou na vida. Esse é o risco específico da poesia.
Não se faz poesia com comunicação fácil. Não se faz poesia
senhor ou senhora de si e das palavras. Não se faz poesia ou se ama sem sentir
medo, sem experimentar a impotência, sem arriscar perder-se no vazio do sem
sentido.
Sentir medo e dizer mesmo assim. Mas como,
afinal, dizer?
Se esta pergunta faz sentido para você, é provável que você
venha a ser um bom leitor, uma boa leitora de poesia. Ou quem sabe, um poeta.
A poesia serve para isso. Para afastar o medo do vazio, do
silêncio, da dúvida, da morte, com o seu grito impotente. Impotente porque no
fim, tudo será mesmo o silêncio.
Mas até lá, eu posso seguir dizendo mais alguns versos
imprecisos. Mas é o máximo que eu posso fazer. Emudecer seria aceitar
mansamente o fim de tudo ou se conformar com o mundo como ele é hoje.
A poesia se faz justamente aí, no intervalo entre o que poderia
ser e o que não será jamais. Um futuro impossível, que se projeta além da
morte.
Mais conhecida como silêncio eterno.
A poesia vive da esperança impossível de não morrer."
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Marcos Imperial