Você é apenas um menino se fingindo de homem
(reprodução). "Seu dia chegará. E chegou [...] Você tem tudo e parece
o cara mais seguro do mundo, como todos os seus colegas e amigos. Mas
só parece. No fundo, você é apenas um menino se fingindo de homem. Assim como
todos os seus amigos
Fabio Hernandez, DCM
Você é um menino. Treze, catorze anos.
Inseguro, tímido. Começa a se interessar pelas mulheres. E não vai demorar para
perceber que mulheres e problemas aparecem juntos em sua vida. Você não sabe
lidar com o mundo novo no qual está entrando. Sua voz está mudando. Os pêlos
estão aparecendo. O futebol já não é seu único interesse. Aparecem os primeiros
bailes. Você não sabe direito que roupas escolher. As sugestões de sua mãe lhe
parecem horríveis. Mãe nunca acerta na roupa do filho, uma lei tão velha e tão
eterna quanto as estrelas no céu e as ondas no mar. Ser criança era muito mais
fácil.
E então você olha para os garotos um pouco mais
velhos. Eles estão nas classes um ou dois ou três anos mais adiantadas que a
sua. Seu olhar mistura admiração e inveja. Eles parecem tão seguros. Tão
confiantes. Alguns ameaçam um bigode, uma barba. A voz já está definida. E as
meninas da sua classe estão apaixonadas por eles, não por você. Eles são mais
altos que você. Eles são melhores que você. Já devem até ter dormido com alguma
menina. E você jamais viu uma mulher nua que não fosse sua mãe ou não estivesse
numa revista. Eles se libertaram daqueles programas sem graça com a família.
Mas seu dia chegará. Os dias hão de passar. Você vai crescer e seus problemas
desaparecerão. Você será um homem firme, forte, como os caras mais velhos.
E eis que você é como eles. Os caras maiores
que você via de longe. Você imaginava que sua vida seria outra. Mas não foi bem
assim. Você cresceu, sua voz engrossou. Você até viaja sozinho, sem os pais,
com os amigos. A virgindade ficou para trás, mas você já percebeu que o sexo
não é o fenômeno extraterrestre que você pensava ser antes de experimentá-lo. É
bom, às vezes muito bom, algumas vezes ótimo. Mas não é coisa do outro mundo. A
terra não treme sempre ao fazer sexo, ao contrário do que você sonhava. Você já
é um homem. Ou quase um homem. E pensava que a segurança máscula viesse com o
tempo, com a mesma naturalidade com que a terra se molha quando vem a chuva.
Mas não.
E então você olha para os homens feitos. Formados, empregados.
Alguns casados. Eles, sim, são os típicos homens. Basta olhar para o andar
seguro, o olhar firme. Eles não têm dúvidas, não têm medos como você. Os mais
ricos têm carros chiques. Pagam com cartão de crédito, e não com
o dinheiro pedido a seu pai, como você. Uns vestem gravatas que devem valer
duas mesadas suas. Alguns têm um cartão em que estão escritos o nome e o cargo.
Nada parece ser capaz de abalá-los. Eles não sentem vontade, nas noites mais
escuras, de pedir um refúgio na cama dos pais. Você sente, às vezes. Seja
honesto: você fez isso outro dia.
Seu dia chegará. E chegou. Você se formou. Arrumou
um emprego promissor. Tem um cartão profissional.
O carro podia ser melhor, mas é bom. Tem ar-condicionado e som. O
namoro é firme. Deve terminar em casamento. Seu armário tem até um blazer
Armani que você comprou num momento de entusiasmo e desvario. Mil reais. Você
parece o cara mais seguro do mundo, como todos os seus colegas e amigos. Mas só
parece. Lá dentro continua uma criança, como todos os seus colegas e amigos.
Todos disfarçam bem. Todos aprenderam que ser homem é ser forte. Você queria
gritar socorro, mas não convém demonstrar fraqueza. Você queria se abrigar no
colo de seu pai, mas ele já não está lá. E então você ri, porque a vida é mesmo
engraçada, repleta de crianças fingindo-se de homens até o último dos
dias."
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Marcos Imperial