A liberdade de manifestação e
expressão, direitos consagrados pela Constituição, não podem ser confundidos
com a ofensa e impunidade. Essa á a avaliação do professor Edson Luís Baldan,
delegado de polícia em São Paulo, especialista em Direito Penal pela Escola
Superior do Ministério Público de São Paulo e professor da PUC, em entrevista
ao Portal Vermelho sobre o caso do boneco inflável que ofende a
imagem do ex-presidente Lula.
Por Dayane Santos.
roduzido
por grupos que foram às ruas para pedir a intervenção militar e defender um
golpe contra o mandato da presidenta Dilma Rousseff, o boneco calunioso foi
murchado após uma reação da União da Juventude Socialista (UJS), na última sexta-feira (28), no
viaduto do Chá, região central de São Paulo. Agora, o boneco perambula
remendado por Curitiba, Paraná.
“Se
eu fizer um boneco de qualquer personalidade pública e malhar esse boneco, pode
ser visto como uma atitude de péssimo gosto, mas não é crime. O problema é
quando esse boneco representa um criminoso, porque o boneco em questão está
trajado com as vestes de um presidiário e traz no peito um artigo do Código
Penal que é o 171, que remete ao crime de estelionato. Isso configura crime de
injúria”, argumenta Edson Baldan.
Previsto
no Código Penal brasileiro, a Injúria é qualquer xingamento que atinja a honra
subjetiva, a autoestima, a imagem que cada pessoa tem de si. De acordo com a
lei, o crime de injúria pode ser cometido de forma escrita, falada, por gesto
ou meio simbólico, como um boneco, com pena prevista de 1 a 6 meses de prisão
ou pagamento de multa.
O
boneco não deixa nenhuma dúvida quanto à intenção de quem fez ou de quem o
exibe que é a de imputar a condição de criminoso a uma pessoa, no caso o
ex-presidente Lula, que não tem nenhuma condenação criminal e sequer está sendo
investigado pelo crime de estelionato. Portanto, fica evidente que houve um
abuso na liberdade de expressão e manifestação”, justifica o jurista.
A
Constituição Federal de 1988 assegura, como direito e garantia fundamental, a
liberdade de expressão, de manifestação, e, portanto, a crítica política é
saudável e fundamental para o exercício pleno da cidadania. No entanto, esse
direito não é ilimitado, pois é preciso garantir também a preservação da imagem
e honra das pessoas.
Livre
expressão não é livre ofensa
De
acordo com o jurista, a liberdade de expressão não pode ser confundida com
imunidade, ou seja, deve ser garantido o direito de livre manifestação e
repelir a censura prévia, o que não significa que serão excluídas as
responsabilidades posteriores pelo que foi veiculado.
“Não
existe nenhuma liberdade que seja absoluta. É preciso fazer uma ponderação e
encontrar um ponto de equilíbrio entre elas. O Direito, em especial o Direito
Penal, fornece mecanismos para o controle de algumas condutas que excedam a
tudo aquilo que é saudável numa democracia, que é a liberdade de expressão, de
manifestação e a crítica política e a ausência de censura. Quando isso passa a
representar meios de ofensas, de ataques pessoais, de ameaça, de achincalhe, de
ferimento à dignidade de pessoas, o direito não protege”, explica o professor.
Ameaças
covardes nas redes sociais
Sem
citar especificamente o caso, mas numa clara referência às ameaças contra a
presidente Dilma Rousseff feitas pelo advogado Matheus Sathler Garcia,
candidato a deputado federal pelo PSDB do Distrito Federal no ano passado,
Baldan criticou a impunidade de tais condutas.
“Um
erro que é maximinizado quando temos, muitas vezes, uma inércia das autoridades
que deveriam coibir esses atos e não o fazem”, adverte o jurista. “Quando
vemos, principalmente no mundo virtual, promessas de mal grave a pessoas, sejam
mandatários ou ex-mandatários, a incitação ao ódio, ao separatismo, a divisão
ideológica do país, nada disso está autorizado pela nossa legislação”, disse.
Defesa
do legado de Lula
Os
grupos responsáveis pelo boneco calunioso pediram a prisão da líder estudantil
Manu Thomazielli, por crime de dano ao patrimônio privado, por supostamente ser
a autora do furo que murchou o boneco. Porém, quando o delegado pediu a nota
fiscal do inflável para formalizar a queixa, ninguém apresentou.
Sobre
a reação dos jovens da UJS que decidiram furar o boneco, o professor afirma que
não foi cometido crime. “A conduta é lícita porque ilícito é o boneco”,
enfatiza.
O
professor lembra que o artigo 163º do Código Penal impede que danifique o
patrimônio alheio, desde que esse patrimônio seja lícito.
“No
caso específico do boneco ele é instrumento do crime. Então, quando a estudante
perfura o boneco e tira a visibilidade dele, age, segundo os termos da lei, em
legitima defesa da honra de terceiro. O Código Penal, nos artigos 23º e 25º,
permite que qualquer pessoa, diante de uma agressão, seja a vida, a honra, a
integridade física própria ou de terceira pessoa, que ela aja com os meios
moderados e necessários para fazer cessar a agressão”, alega o jurista. De
fato, foi escolhido o meio moderado, já que o inflável continua a circular
remendando pelas ruas.
Edson
finaliza destacando que buscar o justo equilíbrio entre o exercício das
liberdades e a garantia da preservação da intimidade e imagem é um caminho
difícil, mas que “tem que ser buscado num país que pretende se consolidar como
uma democracia de verdade”.
E
conclui: “Assistimos muitas vezes uma passividade das autoridades. Ou eles não
veem isso ou não estão atentos ao que está acontecendo. A impunidade, nesses
casos, é um fator de estimulo a mais agressões, ao sangramento e aprofundamento
disso, que passou a ser uma ferocidade e não mais uma saudável manifestação política”.
Do Portal
Vermelho
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