Por TEREZA CRUVINEL do 274,
Se Temer e os
senhores a quem serve entendem um pouco do Brasil, de seu povo e de sua
cultura, devem ter capado o sentido e a gravidade dos gritos de “Fora Temer”
que ecoaram em vários pontos do País, nos blocos e eventos carnavalescos de
rua. Eles invadiram até mesmo as transmissões de emissoras, como a TV Globo,
que tentou ignorá-los mas foi convencida, pela repetência dos fatos, a
registrá-los. O “fora Temer” no carnaval
não contou com organizadores nem apoiadores. Foi expontaneísmo de massas em
estado puro e líquido, um grito do “consciente coletivo” contra o governo
golpista e o desmanche do país, um prenúncio do ocaso que se avizinha. Por coincidência, nesta quarta-feira de
cinzas, com as marcas da festa ainda visíveis nas ruas, Marcelo Odebrecht falará
ao ministro Hermann Benjamim, relator da
ação que pede a cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, sobre a participação da
empreiteira de sua família no financiamento da campanha de 2014, inclusive do
pedido de ajuda que lhe fez o próprio Temer, e da forma como o atendeu. Talvez
explique porque uma parte da grana chegou ao escritório do amigo-irmão do
presidente, José Yunes, pelas mãos do operador Lucio Funaro. Mas ainda que não
seja pela via do TSE, parece cada vez mais improvável a sobrevivência de um governo
que consegue representar tantas faces do descalabro: ilegitimidade, ruína
econômica, entreguismo, involução social e exuberância da corrupção, afora
outros males.
Diferentemente
das manifestações do ano passado pró-impeachment ou contra o golpe, o “fora Temer” no carnaval não foi
previamente combinado pelas redes sociais, não foi convocado por partidos ou
grupos organizados, não teve o apoio da Fiesp ou da CUT, não exigiu a produção
de cartazes e carros de som. Os
antropólogos culturais costumam dizer que no carnaval as fantasias e desejos se
libertam dos controles censórios para irromper em cena. Com o “fora Temer” deu-se o mesmo processo. O
que irrompeu não foi uma fantasia mas o mal estar reprimido com a situação
criada pelo golpe e a ânsia por uma saída política mais imediata. Quem pede
“fora Temer” não quer esperar 2018.
O parentesco
mais próximo que o grito deste carnaval
pode ter é com as “jornadas de junho” de 2013, que reuniram indignados com a
corrupção e decepcionados com a política de esquerda ou de direita, ricos ou
pobres, reacionários e progressistas, oportunistas de ocasião ou inocentes
sinceramente interessadas em “passar o país a limpo”. Mas como em política não
há gesto inútil, aqueles protestos foram capturados e direcionados pelas forças
que já pensavam no golpe. Minada a
popularidade de Dilma, o resto foi vindo. Agora, massas que se reuniram apenas
para brincar o carnaval entoaram um Fora Temer a plenos pulmões. No Rio, houve
até um “Lula lá” de madrugada, no bloco “minha luz é de led”. Mas desprezemos
esta preferência, bem como as declarações de artistas e notáveis, para ficarmos
só com a força expontaneísta do Fora Temer.
Agora vem a
quaresma do governo Temer, um tempo de grandes tribulações. No âmbito do processo do TSE, além de Marcelo
Odebrecht, o relator ouvirá depoimentos de outros delatores da Odebrecht:
amanhã os de Benedito Barbosa da Silva Júnior e Fernando Reis, no Rio, e na
segunda-feira os Cláudio Melo Filho e Alexandrino de Salles Ramos de Alencar,
em Brasília. Benjamim está pisando no
acelerador. A defesa de Temer fará uso de todos os recursos protelatórios, como
pedidos de auditoria e de novas audiências. Chegando ao plenário, o processo
estará sob a regência do ministro Gilmar Mendes, presidente do tribunal e
aliado indisfarçado do presidente. Gilmar pode muito mas não pode tudo. Outras
demonstrações de que o governo não tem condições morais de se sustentar estarão
se acumulando nos próximos dias, com a divulgação de uma parte das delações da
Odebrecht. Elas devem atingir ministros, colaboradores e parlamentares da base
do governo. Ainda que os delatores façam revelações cabeludas sobre Temer,
relacionadas com fatos ocorridos antes de sua posse, ele não poderá ser
processado por elas. O presidente, diz a Constituição, não pode ser processado
e julgado por atos estranhos ao exercício do cargo. Isso não impede, entretanto, que um governanete
açoitado por denúncias graves perca as condições morais e politicas de se
manter no cargo. Se Temer chegar a este ponto, alguma saída terá que ser
produzida pelas elites, ainda que seja no TSE, apesar de Gilmar.
Para Lula, cuja
candidatura já leva jornais como O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo a
clamarem por sua interdição judicial, seria até melhor esperar pela saída
natural, as eleições de 2018. Quando
mais Temer ficar no Planalto, mais desmoralizado estará seu governo no final.
Lula seria beneficiário de um “quanto pior, melhor”, mas o país estaria mais
destruído, dificultando e retardando a recuperação. Também por isso o início do ocaso do governo
é um bom sinal, e sua derrocada será uma redenção.
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Marcos Imperial