POR ROBSON SÁVIO REIS SOUZA, Doutor em Ciências Sociais, professor universitário e membro da Comissão da Verdade de MG
No dia 31 de agosto do ano
passado, logo depois da consumação do impeachment fajuto pelo Senado Federal,
Dilma Rousseff fez um pronunciamento à Nação.
Passados sete meses, reli o texto.
E, ratificando um vídeo publicado aqui no Brasil 247, pude confirmar, sem
ressalvas, que todas as previsões de Dilma acerca das consequências do golpe
estão a se concretizar.
Para que não reste dúvida,
transcrevo abaixo o texto na íntegra e destaco em negrito o que a ex-presidenta
previa à época, comprovando que tais presciências se concretizam nos dias de
hoje.
De fato, o vice e sua camarilha
nos três poderes, com o apoio do governo norte-americano, da mídia manipuladora
e produtora da pós-verdade, do empresariado nacional de mentalidade
escravagista e das elites fascistas de parte da classe média tomaram de assalto
o poder e, sem escrúpulos, estão a destruir as bases da economia e das
políticas públicas nacionais.
Os impostores rasgam a
Constituição cidadã de 1988, emendando-a violentamente mesmo sem apoio e
legitimidade; conspiram contra os pobres, os trabalhadores e os aposentados.
Desmontam o pouco do estado de bem-estar social que construímos em cinco
séculos de história e meio século de democracia. E lançam o país no mais brutal
neoliberalismo. Consuma-se, aqui, a verdadeira história de Ali Babá e seu bando
a saquearem a Nação.
Essa coalização de direita
conservadora que se impõe pela força e pela violência, que deseja fulminar com
os sonhos e as esperanças de um povo na luta por justiça e igualdade precisa
ser enfrentada, nas ruas e nas redes, em todos os espaços, públicos e privados,
diuturnamente.
Dilma também previu que contra os
embusteiros teríamos “a mais firme, incansável e enérgica oposição que um
governo golpista pode sofrer”.
Portanto, não podemos nos
esmorecer na luta contínua contra a coalizão que usurpa o poder.
Vejamos o discurso de Dilma e
suas previsões assertivas (destacadas em negrito) em relação às consequências
de um golpe comandado pelas forças mais perversas que existem nesse país:
Ao cumprimentar o ex-Presidente
Luís Inácio Lula da Silva, cumprimento todos os senadoras e senadores,
deputadas e deputados, presidentes de partido, as lideranças dos movimentos
sociais. Mulheres e homens de meu País.
Hoje, o Senado Federal tomou uma
decisão que entra para a história das grandes injustiças. Os senadores que
votaram pelo impeachment escolheram rasgar a Constituição Federal. Decidiram
pela interrupção do mandato de uma Presidenta que não cometeu crime de
responsabilidade. Condenaram uma inocente e consumaram um golpe parlamentar.
Com a aprovação do meu
afastamento definitivo, políticos que buscam desesperadamente escapar do braço
da Justiça tomarão o poder unidos aos derrotados nas últimas quatro eleições.
Não ascendem ao governo pelo voto direto, como eu e Lula fizemos em 2002, 2006,
2010 e 2014. Apropriam-se do poder por meio de um golpe de Estado.
É o segundo golpe de estado que
enfrento na vida. O primeiro, o golpe militar, apoiado na truculência das
armas, da repressão e da tortura, me atingiu quando era uma jovem militante. O
segundo, o golpe parlamentar desfechado hoje por meio de uma farsa jurídica, me
derruba do cargo para o qual fui eleita pelo povo.
É uma inequívoca eleição
indireta, em que 61 senadores substituem a vontade expressa por 54,5 milhões de
votos. É uma fraude, contra a qual ainda vamos recorrer em todas as instâncias
possíveis.
Causa espanto que a maior ação
contra a corrupção da nossa história, propiciada por ações desenvolvidas e leis
criadas a partir de 2003 e aprofundadas em meu governo, leve justamente ao
poder um grupo de corruptos investigados.
O projeto nacional progressista,
inclusivo e democrático que represento está sendo interrompido por uma poderosa
força conservadora e reacionária, com o apoio de uma imprensa facciosa e venal.
Vão capturar as instituições do Estado para colocá-las a serviço do mais
radical liberalismo econômico e do retrocesso social.
Acabam de derrubar a primeira
mulher presidenta do Brasil, sem que haja qualquer justificativa constitucional
para este impeachment.
Mas o golpe não foi cometido
apenas contra mim e contra o meu partido. Isto foi apenas o começo. O golpe vai
atingir indistintamente qualquer organização política progressista e
democrática.
O golpe é contra os movimentos
sociais e sindicais e contra os que lutam por direitos em todas as suas
acepções: direito ao trabalho e à proteção de leis trabalhistas; direito a uma
aposentadoria justa; direito à moradia e à terra; direito à educação, à saúde e
à cultura; direito aos jovens de protagonizarem sua história; direitos dos
negros, dos indígenas, da população LGBT, das mulheres; direito de se
manifestar sem ser reprimido.
O golpe é contra o povo e contra
a Nação. O golpe é misógino. O golpe é homofóbico. O golpe é racista. É a
imposição da cultura da intolerância, do preconceito, da violência.
Peço às brasileiras e aos
brasileiros que me ouçam. Falo aos mais de 54 milhões que votaram em mim em
2014. Falo aos 110 milhões que avalizaram a eleição direta como forma de
escolha dos presidentes.
Falo principalmente aos
brasileiros que, durante meu governo, superaram a miséria, realizaram o sonho
da casa própria, começaram a receber atendimento médico, entraram na
universidade e deixaram de ser invisíveis aos olhos da Nação, passando a ter
direitos que sempre lhes foram negados.
A descrença e a mágoa que nos
atingem em momentos como esse são péssimas conselheiras. Não desistam da luta.
Ouçam bem: eles pensam que nos
venceram, mas estão enganados. Sei que todos vamos lutar. Haverá contra eles a
mais firme, incansável e enérgica oposição que um governo golpista pode sofrer.
Quando o Presidente Lula foi
eleito pela primeira vez, em 2003, chegamos ao governo cantando juntos que
ninguém devia ter medo de ser feliz. Por mais de 13 anos, realizamos com
sucesso um projeto que promoveu a maior inclusão social e redução de
desigualdades da história de nosso País.
sta história não acaba assim.
Estou certa que a interrupção deste processo pelo golpe de estado não é
definitiva. Nós voltaremos. Voltaremos para continuar nossa jornada rumo a um
Brasil em que o povo é soberano.
Espero que saibamos nos unir em
defesa de causas comuns a todos os progressistas, independentemente de filiação
partidária ou posição política. Proponho que lutemos, todos juntos, contra o
retrocesso, contra a agenda conservadora, contra a extinção de direitos, pela
soberania nacional e pelo restabelecimento pleno da democracia.
Saio da Presidência como entrei:
sem ter incorrido em qualquer ato ilícito; sem ter traído qualquer de meus
compromissos; com dignidade e carregando no peito o mesmo amor e admiração
pelas brasileiras e brasileiros e a mesma vontade de continuar lutando pelo
Brasil.
Eu vivi a minha verdade. Dei o
melhor de minha capacidade. Não fugi de minhas responsabilidades. Me emocionei
com o sofrimento humano, me comovi na luta contra a miséria e a fome, combati a
desigualdade.
Travei bons combates. Perdi
alguns, venci muitos e, neste momento, me inspiro em Darcy Ribeiro para dizer:
não gostaria de estar no lugar dos que se julgam vencedores. A história será
implacável com eles.
Às mulheres brasileiras, que me
cobriram de flores e de carinho, peço que acreditem que vocês podem. As futuras
gerações de brasileiras saberão que, na primeira vez que uma mulher assumiu a
Presidência do Brasil, a machismo e a misoginia mostraram suas feias faces.
Abrimos um caminho de mão única em direção à igualdade de gênero. Nada nos fará
recuar.
Neste momento, não direi adeus a
vocês. Tenho certeza de que posso dizer “até daqui a pouco”.
Encerro compartilhando com vocês
um belíssimo alento do poeta russo Maiakovski:
"Não estamos alegres, é
certo,
Mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?
O mar da história é agitado
As ameaças e as guerras,
haveremos de atravessá-las,
Rompê-las ao meio,
Cortando-as como uma quilha
corta."
Um carinhoso abraço a todo povo
brasileiro, que compartilha comigo a crença na democracia e o sonho da justiça.
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Marcos Imperial