Em entrevista, Pimentel compara o clima de 1968 aos tempos atuais: "Quando o mundo avança, vai haver alguém na frente dizendo 'daqui não passa'".
Como é a evolução da censura no Brasil?
A censura é anterior à ditadura militar. Ela vem desde sempre, na verdade: já existia na República Velha, e foi intensificada durante o getulismo, com músicas sendo cortadas. Ao longo do tempo, ela mudou. Era uma censura moralista em determinado momento, e, na ditadura, se tornou absolutamente política, de enfrentamento à esquerda. A partir da reabertura, volta a ter um fundo mais moral, com a proibição de faixas do rock dos anos 1980. E, recentemente, o Planet Hemp e o B Negão foram reprimidos. Mesmo quando não existe censura oficialmente, ela está lá. A Joyce conta que foi a uma festa com a neta, onde ouviu músicas com conteúdo pesadíssimo. E ela, sendo uma mulher libertária, se viu pensando sobre as referências morais e o limite da liberdade de expressão. Será que realmente pode tudo? É isso que deveríamos discutir, não a volta do AI-5.
Como você relaciona o livro com o momento atual?
PIMENTEL: Na sua entrevista, o Gilberto Gil diz que teria
medo se os filhos e netos passassem pelas mesmas experiências, de luta armada,
prisão, exílio. Não chegamos a isso. Mas os movimentos reacionários sempre
existiram. Quando o mundo avança, seja nas questões sociais ou de minorias, vai
haver alguém na frente dizendo "daqui não passa". No entanto, sou
otimista, como o Gil: a seta do mundo é para a frente. Não adianta querer
barrar o caminho natural das coisas.
O livro nasceu com os 50 anos do AI-5, mas foi finalizado em
um momento em que ele chegou a ser "celebrado" por alguns setores.
Como você vê essa relação?
Certamente nossa escrita foi influenciada. No começo,
pensávamos em ter um capítulo sobre Gonzaguinha, por exemplo, mas chegamos à
conclusão de que precisávamos nos concentrar em quem está vivo, para poder
contar suas experiências. A maior geração da nossa música passou por esse
período, e eles tinham que sair de casa com suas letras para submetê-las a
pessoas toscas, que viam subversão em tudo. O Edu Lobo teve uma música
instrumental censurada porque se chamava "Casa grande". O Ivan Lins
foi chamado para explicar o que era a palavra "zmei", um erro de
digitação — mas o sujeito cismou que era uma linguagem cifrada. Havia muita
paranoia.
E hoje? Vivemos em uma era paranoica?
Sim. Vivemos em uma época não de censura institucionalizada,
e sim de uma censura velada, porém agressiva. São formas diferentes de terror.
Em uma, o Estado podia fazer o que quisesse com você. Essa outra é o terror
cibernético: amanhã alguém pode me detonar, me ameaçar, ou divulgar o meu
endereço, o nome da minha mãe.
Como é a evolução da censura no Brasil?
A censura é anterior à ditadura militar. Ela vem desde
sempre, na verdade: já existia na República Velha, e foi intensificada durante
o getulismo, com músicas sendo cortadas. Ao longo do tempo, ela mudou. Era uma
censura moralista em determinado momento, e, na ditadura, se tornou
absolutamente política, de enfrentamento à esquerda. A partir da reabertura,
volta a ter um fundo mais moral, com a proibição de faixas do rock dos anos
1980. E, recentemente, o Planet Hemp e o B Negão foram reprimidos. Mesmo quando
não existe censura oficialmente, ela está lá. A Joyce conta que foi a uma festa
com a neta, onde ouviu músicas com conteúdo pesadíssimo. E ela, sendo uma
mulher libertária, se viu pensando sobre as referências morais e o limite da
liberdade de expressão. Será que realmente pode tudo? É isso que deveríamos
discutir, não a volta do AI-5.
A arte é sempre política?
Acho que é essencialmente política, porque não deixa de ser
uma tomada de posição da sua visão das coisas diante do mundo. Obviamente há os
mais ou menos engajados. Em 1968, essa discussão era muito forte. Os músicos de
protesto achavam que o tropicalismo era alienado, mas depois acabaram
entendendo que havia um inimigo em comum lá na frente, que queria acabar com os
dois.
O que é pior: a censura institucionalizada ou a forma atual?
É claro que o momento em que as pessoas são presas e torturadas é pior. Mas me entristece ver que, 50 anos depois, há tentativas de trazer isso de volta. Ainda mais lendo as histórias de pessoas que tiveram que sair do país, deixando tudo para trás. Quem tem saudade desses tempos fala da boca para fora, sem conhecer o que de fato aconteceu. O maior inimigo do governo autoritário é o pensamento. Via https://ultimosegundo.ig.com.br/colunas/informe-do-dia/2022-01-04/-maior-inimigo-governo-autoritario-pensamento-.html
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Marcos Imperial