terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Bispo de Limoeiro do Norte recusa homenagem do Senado.

Dom Edmilson disse que a comenda hoje não representa a pessoa do cearense que foi Dom Helder Câmara

 
Em protesto contra o reajuste de 61,8% concedido a deputados e senadores, o bispo não quis receber comenda

Brasília - Uma solenidade de entrega de comenda no Senado terminou em constrangimento para os parlamentares que estavam em plenário. Em protesto contra o reajuste de 61,8% concedido a deputados e senadores na semana passada, o bispo de Limoeiro do Norte (CE), dom Manuel Edmilson Cruz, recusou-se a receber a Comenda dos Direitos Humanos Dom Hélder Câmara.

Em discurso, ele destacou a realidade da população mais carente, obrigada a enfrentar as filas dos hospitais da rede pública. "Não são raros os casos de pacientes que morreram de tanto esperar o tratamento de doença grave, por exemplo, de câncer, marcado para um e até para dois anos após a consulta".

Dom Manuel da Cruz lamentou que o Congresso tenha aprovado reajuste para seus próprios salários, da ordem de 61,8%, com efeito cascata nos vencimentos de outras autoridades, "enquanto os trabalhadores do transporte coletivo de Fortaleza mal conseguiram 6% de aumento em recente luta por elevação salarial", disse. O bispo mencionou também as aposentadorias reduzidas, o salário mínimo que cresce em "ritmo de lesmas".

Comenda

Ao recusar a comenda, o bispo foi taxativo: "A comenda hoje outorgada não representa a pessoa do cearense maior que foi dom Hélder Câmara. Desfigura-a, porém. De seguro, sem ressentimentos e agindo por amor e com respeito a todos os senhores e senhoras, pelos quais oro todos os dias, só me resta uma atitude: recusá-la".

Nesse momento, quando a sessão era presidida por Inácio Arruda (PCdoB-CE), autor da homenagem, o público aplaudiu a decisão.

Após a recusa formal, o bispo cearense acrescentou que "ela é um atentado, uma afronta ao povo brasileiro, ao cidadão contribuinte para o bem de todos com o suor de seu rosto e a dignidade de seu trabalho".

Ele acrescentou que o reajuste dos parlamentares deve guardar sempre "a mesma proporção que o aumento do salário mínimo e o da aposentadoria".

Dom Edmilson Cruz afirmou que assumia a postura com humildade, sem a pretensão de dar lições a pessoas tão competentes e tão boas".

Diante da situação criada, o senador José Nery (Psol-PA) cumprimentou o bispo pela atitude considerada "coerente" com o que pensa.

"Entendemos o gesto, o grito e a exigência de dom Edmilson Cruz que, em sua fala, diz que veio aqui, mas recusará a comenda Dom Helder Câmara. Também exige que o Congresso Nacional reavalie a decisão que tomou em relação ao salário de seus parlamentares", acrescentou o senador paraense.

Protesto

O protesto contra o reajuste dos parlamentares não se resumiu, no entanto, à manifestação do bispo. Cerca de 130 estudantes secundaristas e universitários de Brasília foram barrados na entrada principal do Congresso quando preparavam-se para protestar contra a decisão tomada na semana passada pelos parlamentares.

A intenção do grupo era circular pelas instalações das duas Casas empunhando cartazes com críticas ao aumento. No entanto, por decisão das polícias legislativas, eles não foram autorizados a entrar.

Fique por dentro
Discurso

"O aumento de 61,6% dos parlamentares a ser ajustado deveria guardar sempre a mesma proporção que o aumento do salário mínimo e da aposentadoria. Isso não acontece. O que acontece, é um atentado contra os direitos humanos do nosso povo... A comenda hoje outorgada não representa a pessoa do cearense maior que foi Dom Helder Câmara. Não representa. Desfigura-a, porém. Sem ressentimentos e agindo por amor e por respeito a todos só me resta uma atitude: recusá-la".

Diário do Nordeste, de Fortaleza.

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Marcos Imperial

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