Carta Maior: Em discurso no Fórum Social Temático, Dilma Rousseff usa crise europeia para atacar escalada contra direitos sociais patrocinada pelo 'mercado' e vê risco à democracia. Brasil e América Latina dariam exemplo oposto, com 'esforço do povo e seus governos'. Presidenta também defende Palestina na ONU e mundo multipolar, diante de ampla platéia favorável.
André Barrocal,
Porto Alegre – A presidenta Dilma Rousseff participou nesta quinta-feira (26) de um ato público no Fórum Social Temático com um discurso crítico ao neoliberalismo e à ameaça que a derrocada dele representa para a democracia. Ao mesmo tempo, Dilma exaltou a alternativa política construída na última década no Brasil e em países latino-americanos, hoje em situação mais confortável em meio à crise global.
Para atacar o neoliberalismo, grande inimigo da militância e dos criadores do Fórum Social, Dilma aproveitou o que se vê hoje em países europeus com problemas de dívida e recorreu à memória do que foram os anos 90 no Brasil e na América Latina.
Segundo Dilma, “receitas fracassadas estão sendo novamente propostas na Europa”. Lá, o “mercado”, que foi responsável pela crise, tenta arrumar uma solução para si (receber o pagamento da dívida de que é credor) à custa do interesse popular, propondo e conseguindo emplacar soluções como redução de direitos sociais e trabalhistas.
O resultado desta aplicação concentrada de neoliberalismo será a estagnação, algo que não ajuda a dar às pessoas esperança de um futuro próximo melhor. Para Dilma, desemprego e desigualdade social são “particularmente cruéis” em nações ricas, pois suprimem direitos já existentes, ou seja, as pessoas conhecem o gosto do que estão lhe tirando.
“O mundo do pós-neoliberalismo não pode ser o mundo da pós-democracia”, afirmou a presidenta, mencionado “xenofobia e autoritarismo” como efeitos deletérios deste “pós-neoliberalismo”. “A dissonância entre a voz do mercado e a voz das ruas parece aumentar cada vez mais nos países desenvolvidos, colocando em risco não apenas conquistas sociais, mas a própria democracia.”
Brasil e América Latina estariam dando exemplo oposto, na avaliação de Dilma, desde a chegada ao poder de políticos e partidos identificados com o espírito do Fórum Social. Enquanto na Europa a “chaga social” do desemprego, da desigualdade e da pobreza cresce e a economia patina, nos países latino-americanos é o contrário.
Segundo a presidenta, a região foi capaz de mostrar que “um outro mundo é possível”, como diz o slogan do Fórum Social, construindo “alternativas progressistas e democráticas” contra “preconceitos político-ideológicos” que prevaleceram nos anos 80 e 90 e “inflingiram” um “modelo conservador”. “Nossos países hoje não sacrificam suas soberanias a pressões de potências e grupos financeiros ou agências de classificação de risco.”
Dilma fez questão de enfatizar que a construção do modelo alternativo é fruto de escolhas que estão postas, e não obra do acaso. Ou seja, há deciões políticas por trás. “O lugar que o Brasil hoje ocupa no mundo não é consequência de nenhum milagre econômico, como acontecia no passado”, disse ela, em referência às elevadas taxas de crescimento durante a ditadura militar. “É resultado do esforço do povo brasileiro e de seu governo, que souberam lutar. O Brasil hoje é um outro país”, completou a presidenta, num dos momentos em que foi mais aplaudida.
O ginásio Gigantinho, em que ocorreu o ato, recebeu cerca de 5 mil pessoas, segundo a polícia. Em sua grande maioria, simpáticas à presidenta, embora houvesse um grupo visualmente bem minoritário algo hostil à presidenta, a reclamar do novo Código Florestal em votação no Congresso e do caso Pinheirinho.
O ginásio estava tomado por faixas de PT, PMDB, PSB e PCdoB, partidos que esão no governo, e de entidades com inclinação governista, como as centrais sindicais CUT, CTB e CGTB. O grupo mais crítico a Dilma tinha um cartaz assinado pelo PSOL.
No discurso, Dilma voltou a defender o reconhecimento da Palestina pelas Nações Unidas, como já tinha feito na abertura da Assembléia Geral da ONU em setembro do ano passado. Disse que os BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – lutam por uma “nova ordem mundial, multipolar”, em que o poder está mais dividido. Afirmou que o governo continuará apostando nas relações Sul-Sul, ou seja, com países mais pobres.
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Marcos Imperial