quarta-feira, 25 de novembro de 2015

“Já acabou, Jéssica?” Havia alguém ali – como há, na verdade, em todos os lugares – mais preocupado em registrar o espetáculo violento do que em pacificar.

Apanhou mas não se rendeu.

Nathali Macedo, DCM

Eis o mais recente vídeo viral na internet: uma adolescente aparentemente colegial dando socos e tapas em uma rival e retirando-se, triunfal, em meio aos gritos de entusiasmo dos presentes. (Aqui o vídeo.)

Havia alguém ali – como há, na verdade, em todos os lugares – mais preocupado em registrar o espetáculo violento do que em pacificar. O resultado foram mais de quarenta mil visualizações, outros milhares de
compartilhamentos, memes, piadas e até camisas em “homenagem” à briga.

Confesso que pensei por um instante se isso valia um comentário. Mas algumas memórias tristes me convenceram de que, sim, há algo de muito errado com uma sociedade que se diz anti-violência e faz piada de uma briga de rua.


Em tempo, garanto: eu entendi a piada. A garota se levantou, tentando transparecer uma coragem patética após o vergonhoso nocaute: “Já acabou, Jéssica?”

A frase virou meme

Sim, seria cômico – se não fosse trágico.

Haverá quem diga que o mundo anda chato, politicamente correto e ninguém tem bom-humor para rir de uma piada.

Mas chata, na verdade, é a hipocrisia. Chato é ver que as mesmas pessoas que lamentaram os recentes atentados em Paris, que se indignam com a violência policial, os homicídios, os roubos e as balas perdidas, agora riem de um episódio que nasceu exatamente da mesma ideia de que a violência pode ser risível, pode ser compartilhável, pode ser aceitável.

E que as mesmas pessoas que pregam a paz defendem que “bandido bom é bandido morto”, aplaudem linchamentos públicos e têm orgasmos mentais assistindo UFC, como doentes espectadores numa arena de gladiadores.

Vivemos, portanto, a sociedade do espetáculo e da indignação seletiva, e isso não é engraçado. As pessoas lamentam a violência com um avatar em suas redes sociais enquanto se regozijam com essa mesma violência, de maneira tão alienada que sequer se dão conta.

O sentimento que faz com que as pessoas compartilhem uma surra no meio da rua como se fosse engraçado é exatamente o mesmo que nos faz crer que a violência resolve as coisas: que a polícia pode usar seus cassetetes “em nome da lei”, que uma mulher pode apanhar do marido porque “ela mereceu”, que um garoto pode ser linchado pelos colegas de classe por ser diferente.

O espírito pacificador precisa passar pelos detalhes para que seja convincente. Precisa ser precedido pela ideia de que a violência é condenável em qualquer nível e em qualquer circunstância.

Não importa se não houve derramamento de sangue. Não importa se a garota se levantou. Esse continua sendo mais um triste episódio violento entre os milhares que passam sob os nossos narizes sem que nos indignemos. 
A violência não é engraçada. É preocupante."

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Marcos Imperial

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