Por TEREZA CRUVINEL do Brasil 247.
Raramente uma situação política inverteu-se tão radicalmente em
tão poucas horas. A oposição, que festejava na noite de quarta-feira o
voto com que o ministro Edson Fachin frustrou o governo, deixou
cabisbaixa o plenário do Supremo antes do final da sessão de ontem, em que a
maioria divergiu do relator Fachin e recolocou o rito do impeachment nos
trilhos. O mesmo haviam feito os governistas anteontem.
Com o resultado da sessão memorável – pela qualidade do
debate jurídico e a elegância litúrgica dos ministros, mesmo na
divergência – o governo ganha fôlego e o impeachment perde terreno. O terreno
que a oposição vinha conquistando graças às manobras de Eduardo Cunha
rechaçadas pelo STF.
A presidente Dilma acompanhou a sessão falando diversas vezes ao
telefone com o ministro-chefe da AGU, Luiz Adams, que estava no Supremo. No
final, um suspiro de alívio ressoou no Palácio do Planalto. Dilma riu por
último, e duas vezes. A vitória mais importante foi no entendimento de que a
comissão especial da Câmara deve ser eleita por voto aberto e sem chapas
avulsas. Isso levará a uma nova eleição, que pode garantir ao governo uma
composição mais favorável da comissão. Embora o parecer por ela aprovado,
qualquer que seja, tenha que ser votado pelo plenário, será mais fácil obter os
171 votos se a comissão recomendar a não autorização do processo, considerando que
a presidente não cometeu crime de responsabilidade.
A segunda vitória foi na definição do papel do Senado. Mas, para
o governo, para sua sobrevivência e recuperação, melhor será não ter que barrar
o processo na Casa onde tem base mais fiel e contaria com a ajuda do presidente
Renan Calheiros. O rechaço do Senado a uma autorização da Câmara aprovada por
mais de 342 votos, deixaria algum melindre na relação entre as duas casas,
dificultando a restauração de uma coalizão que garanta a governabilidade, caso
o governo escape do impeachment, com agora tornou-se mais provável. Mas, se não
houver remédio, é claro que a trincheira de resistência será montada no Senado
mesmo.
Agora vem o recesso, que o Governo tentará encurtar,
viabilizando alguma forma de convocação lá pelo segundo decanato de janeiro.
Renan é contra. Acha que melhor será deixar que a temperatura política esfrie
mais no verão. Ao longo de janeiro o governo teria tempo para trabalhar a
eleição da nova comissão especial da Câmara em fevereiro. Quem sabe isso até
venha a ocorrer depois que o STF decidir sobre o pedido de afastamento de
Eduardo Cunha feito pelo procurador-geral Janot.
Flashes da sessão
Ficará nos anais a sessão em que o Supremo fixou as balizas do
impeachment, rechaçando os casuísmos que vinham sendo praticados por Cunha e a
oposição.
Raramente um ministro estreou no STF de modo tão
infeliz quanto Luiz Edson Fachin. Embora tenha colhido elogios abundantes a seu
alentado voto e ao esforço de produzi-lo em tão curto prazo, dele restou
muito pouco. E a impressão externa geral foi a de que Fachin negou quase todos
os pedidos da ação do PC do B não por desconhecer o rito adotado em 1992 mas
para afirmar sua independência, depois que sua indicação por Dilma enfrentou
fortes resistências da oposição, dentro e fora do Senado. Seu voto
foi muito criticado por senadores que apontaram a incoerência entre a
defesa que fez do voto aberto para a homologação da prisão do senador
Delcídio e a legitimação do voto secreto imposto por Eduardo Cunha na eleição
da comissão especial da Câmara.
Quem virou o jogo foi o ministro Luiz Roberto Barroso, que com
clareza e coragem abriu a divergência em relação ao voto do relator,
sustentando o papel do Senado na admissibilidade do processo – o que permitirá
à Casa acolher ou não a denúncia da Câmara, e a impropriedade do voto
secreto na eleição da comissão especial. E o fez não com a “criatividade
jurídica” mas homenageando a letra da Constituição e a jurisprudência
criada pelo Supremo para o impeachment de Collor. Barroso puxou a maioria que
se formou.
Quem deixou o governo perplexo foi o ministro Dias Tofoli, com
um voto alinhado ao do relator e, viu-se depois, ao do ministro Gilmar Mendes,
adversário figadal do PT e do governo no Supremo. Há muito já se sabe do
afastamento entre Tofoli e o partido a que serviu e que o colocou lá mas
nunca ele havia feito comentários tão hostis, como aquele de que um governo que
não tem 171 votos na Câmara não merece governar. Gilmar protagonizou o momento
mais agressivo, dizendo a seus pares quem se queriam manipular o
processo, deviam assumir isso claramente. Falou no plural majestático,
“se nós queremos”. Foi uma ofensa mas a frieza da maioria prevaleceu.
No mais, o brilho de Celso de Mello ao explicar tão claramente
que, com a Constituição de 1988, a Câmara perdeu que lhe garantia a
Constituição de 1946 e a lei complementar 1079/1950 nos processos de
impeachment.
Há 23 anos, quando houve o impeachment de Collor, não havia lei
complementar à Carta de 1988, detalhando o rito e as regras. STF precisou
deliberar. Agora, novamente. Passado o percalço em curso, o Congresso precisa
parar em algum momento para adequar a lei do impeachment à Constituição.
Nada garante que a responsabilidade democrática da corte prevalecerá
sempre, como prevaleceu ontem.
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Marcos Imperial