Foi a defesa da democracia e a denúncia da natureza golpista do
impeachment que deflagrou a mobilização em defesa do mandato de Dilma. Elas não
foram suficientes para impedir que a maioria dos deputados autorizasse o
julgamento da presidente pelo Senado mas serão a base da resistência aos
desdobramentos que virão. Faltou, ou ficou em segundo plano, entretanto, a
denúncia mais contundente sobre o significado da troca de Dilma por Temer.
O
que moveu os blocos conservadores no Congresso, expressando interesses da
Fiesp, Firjan, banca financista, ruralistas e outros blocos econômicos,
foi a possibilidade concreta de trocar o projeto nacional de
desenvolvimento inclusivo, que a trancos e barrancos avançou com os
governos petistas, por uma novo ciclo de políticas neoliberais, de ação
reduzida do Estado, ajuste fiscal rigoroso e reformas restritivas a direitos,
especialmente trabalhistas e previdenciários. Se esta denúncia – que Dilma
ensaiou na véspera da votação, ao dizer que Temer acabaria com os programas sociais
- tivesse sido feita antes e com mais ênfase, talvez a resistência
tivesse atraído para as mobilizações os segmentos que serão mais afetados e não
gravitam em torno de movimentos sociais organizados, como MST, MTST, Cut e
outros. A defesa da democracia calou fundo foi na inteligência
nacional, nas classes medias e na juventude mais politizadas, nos herdeiros da
luta contra a ditadura, junto aos artistas e intelectuais.
Na luta politica, entretanto, leite derramado não é leite perdido.
Na ausência de um plano B, o que a esquerda entoa agora é o refrão “a luta
continua”. Ou a luta só começou. Terá que continuar no governo
Temer pois, nesta altura, nem Dilma deve acreditar sinceramente que
pode virar o jogo no Senado. Ok, não se pode pedir a ela que jogue a toalha e
deixe de lutar por sua biografia, combatendo até o fim para demonstrar que não
cometeu qualquer crime e que está sendo tirada do cargo para o qual foi eleita
por violência institucional revestida de legalidade. O mundo está ouvindo o que
ela diz e se surpreendendo negativamente com o retrocesso civilizatório do
Brasil.
Os outros, porém, devem se preparar para os tempos seguintes. Se o
Senado aprovar a admissibilidade do processo, afastando Dilma por 180 dias
daqui a duas semanas, até Lula já disse que ela não voltará. O governo Temer,
ainda que provisório durante o julgamento, começará a implementar a agenda que
fez dele o coveiro escolhido para dar fim ao que a esquerda gosta de chamar de
governos populares. Na prática, governos que não fazem revolução mas permitem
que alguns nacos ou migalhas caiam da mesa dos privilégios sobre a planície dos
excluídos. Foi o que fizeram os governos petistas e outros governos de
esquerda no que a direita chama de “ciclo neo-populista” da América Latina.
A agenda de Temer é o documento “Ponte para o futuro”, que defende medidas como
o fim da política de valorização do salário-mínimo, restrição aos programas
sociais, reforma trabalhista e previdenciária e algumas privatizações. Vai ter
combate e mais renhido que nos tempos de FHC, quando não havia o ressentimento
com a derrota pela violência legal.
O enfrentamento deste retrocesso exigirá mais que o discurso
democrático. E já não terá o PT como carro chefe. O que emerge nas lutas
sociais são as organizações não partidárias que sustentaram as mobilizações
contra o golpe. A Frente Brasil Popular, mais próxima de Lula e do PT, mas
muito autônoma em suas ações e plataformas, e a Povo sem Medo, em que se
destaca o líder do MTST Guilherme Boulos. Destas novas formas de ação e
organização deve nascer a nova esquerda. E dela, mais adiante, talvez, uma nova
organização partidária que congregue os fragmentos militantes do PT e de
partidos como o PSOL e o PC do B, que saíram fortalecidos do combate.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Olá queridos leitores, bem vindo a pagina do Blog Imperial. Seu comentário é de extrema importância para nosso crescimento.
Marcos Imperial