
EMIR SADER - Colunista do 247, é um dos principais sociólogos e
cientistas políticos brasileiros.
Em algum momento o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) disse que não
haveria eleições antecipadas porque Lula ganharia. Não porque fosse democrático
ou antidemocrático, sino porque a vontade da maioria se imporia e os que
assaltaram e se agarraram ao poder teriam seus interesses e os daqueles que
eles promovem, contrariados.
Agora, em seminário do Instituto
Millenium, se diz que as eleições de 2018 colocariam em risco a estabilidade do
país e, com ela, as (contra)reformas que o neoliberalismo propõe. A voz do
povo, expressa democraticamente, coloca em risco não o país, mas o projeto
neoliberal. Lula é essa imagem do risco.
Diante do desespero do
esfarelamento do governo do golpe que tirou o PT do poder e diante do
crescimento irresistível do Lula nas pesquisas, resta a operação mágica de
prender Lula. Tudo estaria resolvido. Ninguém mais protestaria, a economia
voltaria a crescer, os investimentos externos viriam, o apoio ao governo se
elevaria rapidamente.
Só resta essa solução mágica, a
verdadeira obsessão da direita brasileira: prender Lula. Porque as outras não
deram certo. O governo Temer não uniu o país, salvo contra ele. O governo Temer
não recuperou o prestígio do governo. O governo Temer não atraiu novos
investimentos. O governo Temer não recuperou o crescimento da economia. O
governo Temer sequer uniu a direita.
O fantasma do Lula paira sobre a
cabeça das elites brasileiras, que somente fortalecem sua imagem na cabeça dos
brasileiros pelo tipo de governo desastroso que realizam. Tentaram gerar um
alto nível de rejeição do Lula mediante o acumulo de suspeitas que, mesmo que
nenhuma delas provada, geraria uma sensação de culpa, de algum tipo de
envolvimento de Lula com casos de corrupção. Mas conforme o povo sente que o
problema central do país não é esse, mas suas condições básicas de vida,
atacadas duramente pelo governo surgido do golpe, a imagem de Lula volta com todos
os seus contornos na cabeça das pessoas, seu apoio nas pesquisas sobre
rapidamente e sua rejeição baixa.
Diante do beco sem saída a que o
golpe conduziu o país e a própria direita, não lhes vem à cabeça outra
alternativa senão a de tirar Lula de sua frente. Condená-lo em suas instâncias
e impedir que o STF anule as condenações, pela quantidade imensa de
ilegalidades e de falta de provas, ou simplesmente prendê-lo.
Prender Lula, realizar o sonho da
direita de tirar a liberdade de falar, de circular, de conversar, de dizer suas
verdades, de se encontrar com o povo. Eliminar a imagem de Lula para o povo,
para o país e para suas próprias cabeças, eliminar esse fantasma que lhes tira
o sono.
Mas Lula não é produto ocasional
de uma campanha de marketing, como foi Fernando Collor, como foi João Doria.
Lula está inscrito profunda e irreversivelmente na história do país e na vida
das pessoas. Lula representa dignidade das pessoas, esperança das pessoas. E
isso não se prende.
Em 1968, Sartre e Simone de
Beauvoir foram repartir um jornalzinho maoísta proibido por lei no Quartier
Latin, em Paris. A direita gritou em coro para que o governo os prendesse. De
Gaulle que sabia que um governante representa a sociedade, a historia do pais,
sua cultura, com seu espírito de estadista que encarnava a própria França,
respondeu: "Não se prende Voltaire." Ele queria dizer que não se
prende a dignidade, a liberdade, a esperança.
Como agora podemos dizer:
"Não se prende a esperança. Não se prende a dignidade." A direita não
vai se ver livre de Lula, porque não pode se livrar da própria realidade
injusta que ela criou ao longo da nossa história. O Instituto Millenium convoca
a que 2002 não seja de novo possível. O que só seria possível sem eleições, sem
democracia, sem o voto popular, sem Lula representando a esperança e a
dignidade do Brasil. Mas democracia com restrições à participação de Lula não é
democracia, é regime de exceção, é tirar do povo o direito de decidir os seus
destinos.
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Marcos Imperial