Nota
do Centro de Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes).
As
manifestações de rua e as consequentes respostas governamentais têm gerado um
intenso debate na sociedade sobre as políticas públicas, entre elas, as de
saúde. Para o Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes) o momento é de
celebração do aperfeiçoamento e aprofundamento da democracia brasileira.
Nossa
contribuição nesse debate expõe nossas posições e propostas para o setor da
saúde brasileira cotejadas ao Programa Mais Médicos que o governo apresenta
como estratégia para atendimento das demandas populares.
É
imprescindível reconhecer que a assistência à saúde é dependente dos
trabalhadores da saúde e de sua capacidade de produzir o cuidado. Em uma época
em que se supervalorizam as máquinas, os exames e a tecnologia, é necessário
reafirmar que saúde se faz com gente. Todas as profissões da saúde são fundamentais
para uma assistência integral, ou seja, é a equipe de saúde que será capaz de
atender e resolver todos os problemas apresentados pela população.
A
suficiência quantitativa das equipes de saúde quando bem distribuídas,
permitirão o atendimento universal da população residente em todo o território,
efetivando o direito constitucional dos brasileiros.
Entretanto,
é consenso entre os gestores de todas as esferas do SUS que, entre todas as
categorias profissionais da saúde, os médicos são os profissionais mais
difíceis de prover nos serviços públicos de saúde.
A
população também reconhece esse problema, quando aponta, como mostrou recente
pesquisa do IPEA, que o principal problema do SUS é a falta de médicos. Mesmo
discordando dessa assertiva que localiza a falta de médicos como principal
problema da saúde, o Cebes não pode deixar de reconhecer o que mostram diversos
estudos, que faltam médicos no Brasil, e esta falta ocorre principalmente no
SUS. Não concordando com a argumentação das entidades médicas que insistem na
suficiência de médicos, o Cebes diagnostica a deficiência e má distribuição de
médicos como um problema grave.
Por
outro lado, ressaltamos que o principal problema do SUS não é a falta de
médicos, na verdade mais um dos sintomas do descaso crônico na implantação do
projeto SUS, relegado pelos sucessivos governos pós-constitucional ao destino
de ser um sistema de baixa qualidade para atendimento da população pobre.
É
preciso reafirmar que o principal problema do SUS é a subordinação do setor da
saúde à lógica de mercado que se expande sufocando o direito social previsto na
Constituição. Essa lógica de mercado trata a saúde – e a doença – como
mercadoria e o crescimento desse mercado como vem ocorrendo no país faz com que
a saúde se distancie dos princípios que orientam o SUS enquanto expressão da
saúde como um direito de cidadania.
É
preciso analisar as razões pelas quais os médicos não se vinculam ao SUS e não
ocupam o vasto território vazio destes profissionais.
Nesse
sentido, refutamos o argumento de que são apenas as más condições de estrutura
e trabalho que explicam a ausência de médicos no SUS. Isso só poderia ser
verdade se existisse um contingente de médicos desempregados por recusa de
condições insuficientes, o que não existe.
Ao
contrário, praticamente todos os médicos brasileiros possuem um ou mais
empregos como evidenciam os estudos. Outra pesquisa do IPEA, ainda mais
recente, mostra que, em média, os médicos brasileiros trabalham 42h por semana
e ganham aproximadamente R$ 8.500,00 por mês, o que os coloca no topo de
rendimentos entre as profissões de nível superior.
O
Brasil vive um boom de
crescimento do mercado da saúde e hoje já conta com a presença do grande
capital internacional e fundos de investimentos. Esse boom expressa a
política concreta que vem sendo praticada de promover e conduzir o setor da
saúde ao mercado e se aproveita do resultado da política de inclusão social
pautada pela expansão do consumo, tônica da política econômica dos últimos
anos.
Essa
política de ampliação do consumo associada à omissão, seja por falta de
coragem, ou de tendência na correlação de forças que caracteriza os últimos
governos federais que não enfrentam os interesses dos complexos econômicos da
saúde (indústria farmacêutica, de equipamentos, planos e seguros privados de
saúde, prestadores privados de serviços), e seguem promovendo o crônico
subfinanciamento do SUS, criando as condições ideais para a expansão do mercado
da saúde. Esta é a principal razão que proporciona a concentração de médicos no
setor privado e sua consequente escassez no setor público, e esse modelo
saqueia o SUS e gera outras graves distorções na saúde brasileira.
As
multidões de brasileiros que foram às ruas em todas as cidades exigindo saúde e
serviços públicos de qualidade para nós é a expressão de ser possível iniciar
novos pactos sociais, dentro e fora do setor Saúde, criando efetivas condições
para uma mudança nesta correlação de forças, que privilegie o interesse público
ante os interesses econômicos.
Nesse
contexto de situar o direito à saúde no centro do projeto político de
desenvolvimento social e econômico do país, o Cebes chama a atenção para o fato
de que as medidas que compõem o Programa Mais Médicos são necessárias e
louváveis , porém insuficientes para o setor que necessita urgentemente de
outras medidas estruturantes de curto, médio e longo prazos.
Com
estas referências para o entendimento da crise setorial, expressamos nossa
preocupação e apresentamos propostas em relação ao Pacto pela Saúde formulado
pelo Governo Federal:
•
Mediante a injusta falta de assistência médica que acomete a população e a
dificuldade dos gestores em contratar profissionais médicos, é muito bem vinda
a atração de profissionais médicos estrangeiros ao país. Entretanto, esta
medida deve ter caráter emergencial e focalizado para garantir o clamor do povo
brasileiro que expressou isso nas ruas denunciando que parcelas significativas
da população não tenham garantido seu direito constitucional à assistência
médica. Simultaneamente deverão ser adotadas medidas estruturantes para o
problema;
• Mesmo
sem tangenciar o grave problema do subfinanciamento setorial, o anúncio de
investimentos na infraestrutura das unidades de saúde, especialmente na Rede de
Atenção Básica, constitui uma medida importante e necessária, que respeita os
profissionais de saúde e principalmente os usuários do SUS. A medida adequada e
de longo prazo é garantir financiamento para investimentos permanentes no
sistema;
• É
preciso aprofundar as mudanças curriculares na formação médica, para além da
ampliação do tempo do curso. Nesta perspectiva o Ministério da Saúde, como
gestor nacional do Sistema Único de Saúde, deve fazer valer sua atribuição
constitucional de “ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde”,
expressa no inciso III do artigo 200 da Carta Magna;
• É
preciso que as universidades tenham como missão primeira formar os
profissionais de saúde com o perfil necessário para as necessidades da
população brasileira, ou seja, o trabalho no SUS. Para isso, é fundamental que
o ensino seja totalmente integrado com a Rede de Atenção à Saúde e que sejam
rompidos os entraves que apartam os Hospitais Universitários do SUS;
• É
igualmente necessário que a expansão das vagas e cursos de graduação em
medicina seja feita essencialmente via universidades públicas, e nas
localidades que mais necessitam de médicos. É preciso ampliar acesso e
interiorizar as escolas de medicina, e isso deve ser feito pela expansão da
rede de Universidades Federais;
• Tão
importante quanto formar médicos com perfil ético e humano para trabalhar no
SUS é formar os especialistas necessários para garantir a integralidade da
assistência. Universalizar a Residência Médica e torná-la obrigatória,
garantindo vagas a todos os egressos de acordo com as necessidades do Sistema
Único de Saúde, é uma necessidade;
•
Merece nosso apoio a contratação estratégica de médicos brasileiros, por parte
do governo federal, para atuarem nos municípios e áreas de difícil provimento,
onde a ausência desses profissionais é mais sentida pela população. Mas são
necessárias mudanças na Lei de Responsabilidade Fiscal que limita a capacidade
das municípios e estados para a contratação de profissionais de saúde que
preferencialmente devem estar vinculados institucionalmente aos municípios;
•
Imediatamente deve ser criado e implantado o Plano Nacional de Cargos,
Carreiras e Salários para os trabalhadores do SUS, conforme foi apontado na
última Conferência Nacional de Saúde. O Cebes defende a criação imediata da
carreira nacional nos moldes do definido pela Mesa de Negociação Permanente do
SUS.
É
fundamental que o governo federal saiba aproveitar esse momento em que a
sociedade brasileira reivindica serviços públicos de saúde com garantia de
acesso e qualidade e corrija o erro que foi a regulamentação da Emenda
Constitucional 29 sem a vinculação do percentual de 10% da Receita Corrente
Bruta da União para a Saúde.
Com a
retirada dos incentivos e renúncias fiscais aos planos e seguros privados de
saúde e com o incremento de recursos advindos dos royalties do Pré-Sal e da
Taxação de Grandes Fortunas, é perfeitamente possível garantir esse patamar
mínimo de investimento na saúde dos brasileiros sem que isso acarrete em
desequilíbrio fiscal.
Temos
convicção de que, com o investimento adequado e com a coragem necessária para
enfrentar os interesses econômicos que incidem sobre o setor saúde, é possível
e necessário consolidar o direito cidadão à saúde e o Sistema Único de Saúde,
como demanda o povo brasileiro. O SUS precisa de Mais Médicos e de Muito Mais…
Centro
Brasileiro de Estudos de Saúde. Postado por Marcos Imperial, via VioMundo..
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