Por Marcelo Zero (*)
Ele nasceu miserável, um excluído do Brasil. Como milhões, ele nasceu um
“desistido” do seu próprio país. Provavelmente, teria morrido antes dos 5 anos,
como muitos iguais a ele. Sobreviveu. Lutou contra a miséria opressiva, a pior
forma de violência, como dizia Gandhi. Lutou contra a ditadura, que desistia do
povo em prol de uma minoria. Lutou por uma democracia para todos, não uma
democracia para poucos, que desistia da maioria. Fundou um partido de esquerda
em pleno regime militar, pelo qual ninguém dava nada, e lutou por décadas para
chegar à presidência. Fez o melhor governo da história recente do país. Mudou o
Brasil.
Ela também. Qualquer pessoa que é presa e
barbaramente torturada aos 19 anos tende a desistir. Até da vida. Mas ela
persistiu, e continuou e aprofundou a obra iniciada por ele. Mesmo em meio à
pior crise mundial desde 1929, faz um governo para todos os brasileiros. Faz um
governo que não desiste de ninguém.
Lula e Dilma nunca desistiram do Brasil. Apesar de tudo. Apesar do ódio que lhe
dedicam os que nunca foram ‘desistidos” pelo país.
Mas o que significa realmente “não desistir do Brasil”? Significa não desistir
do povo brasileiro. Afinal, sem o seu povo, o Brasil é mera abstração.
Este é um país que historicamente desistiu da maioria da população. Aqui,
governava-se para poucos e excluíam-se muitos. Diziam que para crescer, era
necessário concentrar renda e patrimônio. Diziam até que os pobres eram um
problema. Que o Nordeste era um problema. Tínhamos governos que assistiam a
poucos e desistiam de muitos. Tínhamos governos que, ante qualquer crise,
“ajustavam” a economia promovendo desemprego e reduzindo salários, desistindo
dos trabalhadores.
Este era o país em que predominava uma lógica perversa, segundo a qual, para
que o Brasil e sua economia fossem bem, era necessário que o povo fosse mal.
Era preciso desistir do povo para não desistir do Brasil.
Lula e Dilma inverteram essa lógica perversa. Agora, o Brasil se fortalece
junto com seu povo, especialmente a população mais pobre. Na realidade, hoje o
Brasil se fortalece graças ao fortalecimento do seu povo. Para os governos de
Lula e Dilma, não desistir do Brasil significa realmente não desistir do seu
povo.
Assim, não desistir do Brasil significa tirar 36 milhões da pobreza absoluta,
da sua histórica “desistência”, e promover a ascensão de outros 42 milhões à
classe média. Não desistir do Brasil implica elevar o salário mínimo e a renda
dos trabalhadores, mesmo em meio à crise global. Não desistir do Brasil
significa não desistir de gerar empregos com carteira assinada para mais de 20
milhões de brasileiros. Não desistir do Brasil implica não renunciar a abrir as
portas das universidades públicas e privadas para pobres e afrodescendentes,
como o governo Dilma vem fazendo. Não desistir do Brasil significa tirar das
trevas 15 milhões de pessoas que tinham sido “desistidas” de ter luz elétrica.
Não desistir do Brasil significa insistir em levar, com o Mais Médicos, médicos
para 50 milhões de brasileiros que estavam “desistidos” de ter acesso à Saúde.
Não desistir do Brasil implica, sobretudo, não desistir de reduzir as
desigualdades sociais e regionais do Brasil, pois elas são as mães de todas as
nossas “desistências” históricas.
Todas as nossas fraquezas e insuficiências como país e como nação derivam,
essencialmente, do fato de termos, ao longo de 500 anos de história, desistido
do nosso povo. Fomos, durante muito tempo, um país cronicamente frágil,
vulnerável e dependente porque não apostamos, como deveríamos, na força da
nossa população. Não apostamos no imenso potencial do nosso mercado interno.
Não apostamos na libertação do nosso povo das garras da miséria. Não apostamos
na libertação do nosso povo dos grilhões da ignorância.
Não apostamos no fato de que essa libertação seria a verdadeira libertação do
Brasil.
Com efeito, o Brasil que desistia de seu povo era um país fraco e fadado ao
fracasso. Já a construção recente desse novo país mais forte, mais justo, mais
resistente às crises e mais soberano só se faz com a ascensão do seu povo. Só
se faz com a insistência em nele investir.
Esse é um processo que mal começou, pois não se revertem 500 anos de
“desistências” em apenas 12 anos.
Ainda assim, há gente que quer reverter tal processo. Tem gente que quer
desistir do aumento do salário mínimo, pois ele estaria “muito elevado”. Há
gente que quer desistir da geração de empregos formais, pois seria necessário
“ajustar a economia”. Há candidatos que desejam “flexibilizar” direitos
trabalhistas e previdenciários, para aumentar a produtividade e reduzir custos.
Tem gente que quer desistir da exploração soberana do Pré-Sal. Há forças que
querem desistir da Petrobras e implantar a Petrobrax.Tem gente que deseja até
desistir do desenvolvimento sustentável, em nome de um ambientalismo
conservador e primitivo.
Há, sobretudo, economistas conservadores, que assessoram candidatos que
insistem em se apresentar como progressistas, que querem promover aqui as
mesmas políticas ortodoxas que vêm “desistindo” do emprego, da renda, de
direitos consolidados e do Estado do Bem-Estar, em países desenvolvidos.
Políticas que insistem na concentração dos rendimentos e do patrimônio. As
mesmas políticas que, segundo Picketty e vários outros, tendem a fazer que o
capitalismo “desista” da democracia.
Enfim, há forças políticas e candidatos que querem, de novo, desistir do povo
brasileiro. Querem, no fundo, voltar a um passado de exclusão. Voltar à lógica
perversa que sempre nos colocava o falso dilema de ter de escolher o entre o
bem estar do povo e o bem estar do mercado.
Nessas eleições, o verdadeiro e único embate, não importa qual a cortina de
fumaça que se lance, não importam as quimeras imaginadas pelas “terceiras
vias”, será o embate entre aqueles que não aceitam desistir do povo brasileiro
e aqueles que acham que esse é um “preço aceitável” para não “desistir do
Brasil”.
Insistir no povo ou desistir do povo, essa é a questão. (*) Marcelo Zero é
formado em Ciências Sociais pela Unb e assessor parlamentar do Partido dos
Trabalhadores Fonte: Blog do jornalista Paulo Moreira Leite.